Maria Bethânia declama Fernando Pessoa - Canta O doce mistério da vida

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  • Опубліковано 6 січ 2012
  • Poema Do Menino Jesus
    Num meio-dia de fim de primavera eu tive um sonho como
    uma fotografia: eu vi Jesus Cristo descer à Terra.
    Ele veio pela encosta de um monte, mas era outra vez
    menino, a correr e a rolar-se pela erva
    A arrancar flores para deitar fora, e a rir de modo a
    ouvir-se de longe.
    Ele tinha fugido do céu. Era nosso demais pra
    fingir-se de Segunda pessoa da Trindade.
    Um dia que DEUS estava dormindo e o Espírito Santo
    andava a voar, Ele foi até a caixa dos milagres e
    roubou três.
    Com o primeiro Ele fez com que ninguém soubesse que
    Ele tinha fugido; com o segundo Ele se criou
    eternamente humano e menino; e com o terceiro Ele
    criou um Cristo eternamente na cruz e deixou-o pregado
    na cruz que há no céu e serve de modelo às outras.
    Depois Ele fugiu para o Sol e desceu pelo primeiro
    raio que apanhou.
    Hoje Ele vive na minha aldeia, comigo. É uma criança
    bonita, de riso natural.
    Limpa o nariz com o braço direito, chapinha nas poças
    d'água, colhe as flores, gosta delas, esquece.
    Atira pedras aos burros, colhe as frutas nos pomares,
    e foge a chorar e a gritar dos cães.
    Só porque sabe que elas não gostam, e toda gente acha
    graça, Ele corre atrás das raparigas que levam as
    bilhas na cabeça e levanta-lhes a saia.
    A mim, Ele me ensinou tudo. Ele me ensinou a olhar
    para as coisas. Ele me aponta todas as cores que há
    nas flores e me mostra como as pedras são engraçadas
    quando a gente as tem na mão e olha devagar para
    elas.
    Damo-nos tão bem um com o outro na companhia de tudo
    que nunca pensamos um no outro. Vivemos juntos os dois
    com um acordo íntimo, como a mão direita e a esquerda.
    Ao anoitecer nós brincamos as cinco pedrinhas no
    degrau da porta de casa. Graves, como convém a um DEUS
    e a um poeta. Como se cada pedra fosse todo o Universo
    e fosse por isso um perigo muito grande deixá-la cair
    no chão.
    Depois eu lhe conto histórias das coisas só dos
    homens. E Ele sorri, porque tudo é incrível. Ele ri
    dos reis e dos que não são reis. E tem pena de ouvir
    falar das guerras e dos comércios.
    Depois Ele adormece e eu o levo no colo para dentro da
    minha casa, deito-o na minha cama, despindo-o
    lentamente, como seguindo um ritual todo humano e todo
    materno até Ele estar nu.
    Ele dorme dentro da minha alma. Às vezes Ele acorda de
    noite, brinca com meus sonhos. Vira uns de pena pro ar,
    põe uns por cima dos outros, e bate palmas, sozinho,
    sorrindo para os meus sonhos.
    Quando eu morrer, Filhinho, seja eu a criança, o mais
    pequeno, pega-me Tu ao colo, leva-me para dentro a Tua
    casa. Deita-me na tua cama. Despe o meu ser, cansado e
    humano. Conta-me histórias caso eu acorde para eu
    tornar a adormecer, e dá-me sonhos Teus para eu
    brincar.

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